Ou como nossas expectativas influenciam nossos filhos
Chegou uma
professora nova na escola e disseram para ela que o Daniel era ótimo em matemática.
A Fabiana, tirava as melhores notas da sala em português. Disseram também que o
Paulo era muito arteiro e que a Joana falava demais, acabava atrapalhando os
coleguinhas. No ano seguinte, mudaram de professora, ela relatou que o Daniel
era ótimo em matemática, a Fabiana em português... O que ela não sabia era que
nada disso era verdade (nem mentira), esses quatro alunos da classe foram
escolhidos na sorte para terem um comportamento qualquer atribuidos a eles.
Curiosamente, um ano depois, eles eram realmente aqueles que a professora
acreditava que eles eram. Mas como assim? Como eles realmente viraram uma pessoa
com características possivelmente diferentes só por que a professora disse que
eles eram assim? Cade a personalidade deles? E a professora não percebeu que, pelo
menos até o ano passado, Daniel era um alino mediano em matemática (pelo era o
que suas notas mostravam)?
A verdade é
que somos o que somos porque crescemos no meio em que vivemos, com estímulos próprios
desse ambiente, vindos de todas as partes. Mas essa influência é muito
discreta, por isso aquela impressão de que meu eu, meus valores, meu caráter,
não mudam, ninguém compra. Vou tentar explicar um pouquinho como isso funciona
nesse texto e porque temos que ficar muuuito atentos a forma como rotulamos
(rotulam) nossos filhos.
Vou voltar
então, no exemplo da professora acima. Como eu disse, Daniel era um aluno
normal, com notas regulares em matemática. Quando chega na classe essa
professora que acredita que ele seja o melhor da sala, ela vai estimulá-lo
dessa forma. Quando ele estiver fazendo um exercício e errar, ela possivelmente
vai dizer coisas do tipo: “Mas olha que besteirinha, você só esqueceu que a
multiplicação sempre vem antes da adição” e vai atribuir o erro a uma pequena
falta de atenção. Quando ele estiver com dificuldades, vai dizer: “Eu sei que
você consegue, eu acredito em você” e ele vai se sentir estimulado. Quando
acertar, a professora vai atribuir adicionar o acerto a coluna de realizações
normais. Esse, o acerto, é o comportamento normal dele. Daniel vai assimilar
esse sentimento, internalizar isso, e logo, logo esse vai ser o comportamento
normal dele, de acertos. Se acertos é o que se espera dele (ele mesmo também
espera isso), ele vai se dedicar mais, estudar mais pra corresponder aquela
característica que ambos acreditam ser dele. O que consequentemente acaba
aumentando a nota dele e fazendo com que ele seja muito bom em matemática.
Já com a
Joana, por exemplo, o efeito contrário acontece. Imagina a situação, enquanto a
professora explica o exercício a Joana (ou o colega) não entendem muito bem e
começam a conversar no intuito de compreender o que deve ser feito. A
professora vê os dois conversando e logo pede silêncio. Veja bem, conversar
sobre a lição, o conteúdo da aula é algo positivo, enriquece o conehcimento de
ambos os alunos. Mas a professora na crença de que Joana fala demais, poda
desde o início esse comportamento, pois não quer burburinhos na sala de aula.
Quando Joana explica a situação, ela diz: “Não interessa, exercício é pra fazer
em silêncio, se você está com dúvidas, pergunte a mim, dessa forma você
atrapalha os outros”. É possível que se fosse o Daniel, em vez brigar expondo
pra toda a classe, ela chegasse perto e perguntasse: “está tudo bem?”. Quando
ela vê Joana conversando de novo e de novo, diz coisas coisas do tipo: “Não
está vendo que você está atrapalhando?”. Joana, que antes tinha um
comportamento positivo e ajudava os colegas se sente desconfortável, começa a
acreditar que atrapalha mesmo os outros. Como Daniel, começa a internalizar
essa característica e a ter comportamentos nesse sentido.
Talvez esses
exemplos pareçam exagerados, talvez até sejam mesmo. Mas na vida real isso
acontece, mas é aos pouquinho e discretamente... é assim que as crenças dos
outros viram nossas próprias crenças. É assim que nos tornamos quem os outros
esperam que a gente seja ou pelo menos, que um certo comportamento faça parte
do nosso repertório de ações. Um exemplo bobo, mas que eu tenho certeza, já
aconteceu com você, já aconteceu comigo. Você entra numa loja porque precisa comprar
algo e vê uma fila enorme! Logo se apressa pra entrar na fila também, porque
não quer ficar muito tempo lá. Mais uma, duas pessoas fazem o mesmo. E ninguém mais
entra depois, porque não tinha mais ninguém na loja (fica essa impressão). Quem
já trabalhou em caixa, ou algo assim, vai dizer que sempre tem uma hora que
todos os clientes resolvem passar juntos. Ou seja, de alguma forma, a crença
coletiva de que a fila vai demorar faz com que todos entrem na fila, fazendo
com que ela realmente demore, confirmando a crença anterior. Isso se chama
profecia autorealizadora e acontece meeeesmo e o tempo inteiro.
E acontece
desde muito antes do filho nascer! Mamãe e papai estão ali, planejando o baby.
Papai morre de medo de ter um menino, ele diz que foi muito arteiro quando
criança, se tiver um menino vai ter que preparar o coração pra aguentar. Alguns
meses depois, descobrem a gravidez, descobrem que é um menino. O bebê chuta
muito, diz a mãe: “Nossa, vai ser agitado”. Aqui, mãe e pai começam a confirmar
a crença de que a criança vai ser arteira, agitada, espoleta... Talvez a mesma
quantidade de chutes vindos de uma menina não teriam sido considerados como
excessivos, como sinal de agitação, afinal, bebê que mexe, só está se mostrando
saudável.
O bebê
nasce... vai crescendo... e as interações com pai e mãe continuam... Ele começa
a engatinhar, vai na direção da escada. A mãe diz que não pode. Ele vai de novo
e de novo... O pai diz: “Ta vendo, só quer o que não pode”, reforçando a crença
de ambos sobre o filho. Talvez se fosse uma menina, se fossem outros pais, essa
criança teria sido rotulada como exploradora. Ou talvez o comportamento de ir
repetidas vezes na escada (normal de toda criança de ir desbravar o mundo) nem
tivesse sido notado, comentado. Mas aqui, nesse contexto, com esses pais, ele
foi. Foi anotado, marcado, reforçado... Esse e tantos outros que poderiam ter
passado despercebidos entraram na categoria já pré-determinada de uma criança
arteira.
E assim,
desde bebezinho, desde a barriga, esse bebê é rotulado como agitado. Ele
internaliza isso como sendo verdade. E é mesmo, é verdade na cabeça dos pais e
de todos que estão em volta. Cada vez que ele escala o berço, sobre numa
árvore, vai parar no hospital... Todos acham normal, porque ele sempre foi agitado,
faz parte da personalidade dele, vão dizer. E faz mesmo! Ele se transformou
nesse menino arteiro, pois é o que esperavam dele.
É claro que
existe uma personalidade que talvez independa do meio. Pelo menos eu acredito
nisso. Mas grande parte do que somos e seremos no futuro é sim determinado por
aquilo que esperam e acreditam da gente. Parte da discussão sobre esteriótipo
de gênero passa por isso. Aqueles que defendem que diferenças entre homem e
mulher vem somente da natureza estão cruelmente enganados. Óbvio que
mulher e homem são diferentes, e óbvio que parte dessa diferença é biológica.
Mas mulher e mulher também são diferentes. O que é “comportamento de homem”
depende da sociedade onde ele está inserido.
Quando
tomamos consciencia disso, podemos mudar o olhar que temos sobre nossas
crianças. Não vai virar um olhar neutro, pois isso é simplesmente impossível.
Mas talvez seja um pouco menos direcionado? Pelo menos é o que tento acreditar.
Quando me disseram: “ainda bem que é menina, pois se fosse menino, criado por
voê, ia ser muito fresco”. Eu me pergunto o que “ser fresco” significa pra essa
pessoa e digo que menino, menina, fresco ou não, eu só quero que ela possa ser
ela mesma, que ela seja feliz!
Não vou ser
hipócrita a ponto de dizer que não tenho expectativas sobre como minha filha
é/deve/vai ser. Todos temos, mas acredito que sabendo que ela pode vir a ser
aquilo que acredito, tento ser mais leve. Me questiono, questiono os outros e
peço que não digam que ela é isso ou aquilo. Especialmente quando o isso ou
aquilo é algo que considero negativo. E assim vamos, tentando acertar, sempre!
Tentando sempre o melhor pra ela(s) se tornem seres humanos felizes. É só o que
eu quero. Que sejam felizes. E se nossas crenças tem poder de se tornarem
realidade, eu agradeço todos os dias de ver que minha filha é feliz!
Que sigam suas próprias personalidades e sejam feliz, é difícil, é um desafio, mas era a minha intenção. rs sabendo que estamos sempre prontos a ajudar, socorrer e amar !
ResponderExcluirSempre revendo nossas atitudes, pra que possamos melhorar sempre!
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